Quinze policiais militares e civis estão na lista de suspeitos de terem tentado matar um juiz da comarca de Várzea Grande. Todos condenados, a maioria por crimes de roubo e formação de quadrilha. O dossiê com os nomes foi encaminhado para a Polícia Judiciária Civil, que conduz as investigações.
O juiz decidiu falar com a imprensa sob a condição de não ter nem o nome e nem a imagem revelados. Ele teme pela vida dele e da família. Desde a ameaça de morte, em janeiro, ele anda sob escolta de 1 policial e 2 seguranças 24 horas por dia. Não tem residência fixa e vive no isolamento, limitando-se ao trabalho e à família. "Eu não tenho mais lugar fixo para morar. Passo um tempo no hotel, na casa de colegas, volto para hotel, não paro muito tempo em um lugar".
O magistrado diz estar convicto de que policiais condenados em processos julgados por ele, muitos afastados de seus cargos, estão envolvidos no atentado ocorrido em janeiro.
Pouco tempo antes do fato, o juiz teria determinado o afastamento de um grupo de policiais envolvidos com uma quadrilha. O processo, que tramitava em outra vara, foi parar nas mãos do juiz. Uma sentença proferida por ele, afastando os acusados das atividades, prejudicou um pedido de habeas corpus feito por eles. Uma testemunha teria confirmado ao magistrado que o bando teria contratado um pistoleiro para matá-lo. "Esta pessoa, que é ex-mulher de 1 bandido, me confessou que o pistoleiro já estava na cidade para fazer o serviço. Eles querem se vingar".
Atentado - No dia 7 de janeiro, um veículo foi até a chácara onde o juiz residia. Apenas um funcionário estava no local. Pouco tempo depois a mesma pessoa retornou em uma motocicleta. Como o magistrado não estava, deixou um recado para o empregado de que "tinha um recado para o magistrado de Santo Antônio de Leverger", onde está localizado o presídio militar. Também disse para 2 vizinhos que "voltaria, pois uma hora ele (o juiz) tinha que voltar para casa".
O magistrado conta que, assim que foi avisado do ocorrido, decidiu passar uma temporada no estado de São Paulo. Lá ficou por um período de 30 dias, enquanto solicitava segurança ao Tribunal de Justiça. Somente 2 meses depois conseguiu a liberação de 1 policial para escoltá-lo. "Eu comuniquei o fato ao Tribunal de Justiça e como não vi retorno, encaminhei ofícios às associações dos magistrados, que interviram e cobraram medidas do governo".
O dossiê com o nome dos suspeitos está em poder do Serviço de Inteligência da Polícia Judiciária Civil e as investigações seguem em sigilo. O juiz, que acompanha o trabalho, lamenta o fato de, mesmo com as descrições do criminoso, nenhum retrato falado ter sido feito até agora. "Isso só vai ser feito quando o pior acontecer?".
O juiz também criticou a morosidade, já que até agora, ninguém foi identificado, mas disse estar confiante no trabalho da Polícia.
Medo - A sensação de insegurança e o medo são sentimentos que acompanham o magistrado 24 horas por dia. Ele conta que teme pela segurança da família que o acompanha nas mudanças rotineiras e que nunca mais vai se sentir seguro.
Ele relembrou outros casos, em que passado algum tempo as pessoas pensaram estar livres e seguras, mas continuaram sendo perseguidas e, algumas, mortas. "Foi assim com Leopoldino (juiz Leopoldino Marques do Amaral), que 1 ano e meio depois foi morto. E também com o Sávio Brandão (empresário). Depois que eles dispensaram os seguranças, foram mortos. Eu jamais vou me sentir seguro".
O juiz relata que, sem escolta, abandona o trabalho. "Eu não me intimido porque sou pago pelo Estado para trabalhar, esta é a minha profissão, e vou continuar trabalhando. Mas se não tiver segurança garantida, aí eu desisto".
O magistrado cobra mais segurança para os juízes que atuam em processos envolvendo organizações criminosas, já que ficam frente à frente com os bandidos e correm perigo. "As sentenças são dadas frente à frente do bandido. Por isso, os magistrados acabam tendo uma vida diferente, se isolando muito".
Este não é o primeiro caso que chega ao conhecimento da Associação Mato-grossense de Magistrados (Amam). No início do ano, o juiz de Execuções Penais de Cáceres (225 km a oeste de Cuiabá) recebeu ameaças de morte por telefone e foi surpreendido por um ataque na casa onde morava com a família. O magistrado precisou de escolta por um longo período.
A suspeita é que as ameaças teriam partido de presos da cadeia municipal, que teriam tido muitas regalias suspensas por decisão da direção e da Justiça.
O juiz coordenador do Departamento de Defesa de Prerrogativas da Amam, José Arimatéa Neves Costa, ressaltou que, nestes casos, a associação cobra a segurança dos magistrados ao Tribunal de Justiça. Porém, as medidas têm que ser adotadas pelo próprio tribunal.
Ele reforçou que a discussão está em andamento no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e todos os juízes estão sendo consultados para definir medidas de segurança. "Os juízes estão sendo consultados, para que dêem sugestões do que pode ser feito, que situação já enfrentaram, e que tipo de segurança precisam".
Até mesmo Costa, que é titular da Vara do Crime Organizado, e por lei teria direito à segurança, não é assistido.
Balista - O número de ações envolvendo policiais é grande segundo o magistrado, que ingressou no Judiciário de Mato Grosso em 1998 e chegou em Várzea Grande em 2009, após passar por Diamantino, Nova Xavantina e Pontes e Lacerda.
A maioria deles acusada de crimes de roubo, como o esquema denunciado na operação "Balista", com envolvimento de 2 PMs. Ao todo, 17 pessoas foram presas acusadas de roubo e furto a caixas eletrônicos e estabelecimentos comerciais, roubo de caminhões e tráfico de drogas e medicamentos sujeitos à controle especial.
Os 2 policiais auxiliavam os líderes do bando prestando informações sobre o policiamento do local onde os crimes seriam praticados e, ainda, colaboravam no transporte de drogas e aquisição de armamentos.
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